Mulheres e Meninas na Ciência

Por Evelyn Ludovina Foto acervo pessoal

Gratidão, honra e recompensa. Essas palavras carregam o peso do sentimento de uma conquista. Carolina Benone e Marcele Passos personificaram esses significados ao serem premiadas pela L’Oréal, em 2024. com o prêmio “Para Mulheres na Ciência”. A premiação pretende incentivar a busca pelo equilíbrio dos gêneros no cenário acadêmico e destacar o papel transformador das mulheres na sociedade.

Ambas são professoras da UFPA e atuam em áreas distintas, mas com um ponto em comum: a pesquisa em Ciências Exatas. Carolina Benone, doutora em Física, tem se dedicado ao estudo das propriedades de buracos negros. Marcele Passos, doutora em Engenharia Química, foi premiada pela sua pesquisa sobre tratamentos alternativos e sustentáveis para infecções bacterianas, contribuindo com soluções inovadoras para problemas de saúde pública.

Juntas, elas compartilharam suas experiências em uma entrevista para o Beira do Rio, discutindo gênero, desafios e a importância da representatividade feminina na ciência. Com suas vozes e conquistas, inspiram novas gerações de pesquisadoras a ocuparem seus espaços e ampliarem o alcance da ciência no Brasil.

Gênero na trajetória acadêmica

Carolina Benone - Ouvi comentários de que eu não deveria estar ali, que não deveria seguir determinada linha de pesquisa. Esses comentários vêm tanto de colegas de sala de aula quanto de professores. Também é complicado quando participamos de eventos nacionais e internacionais e vemos uma baixa representatividade feminina, tanto em termos de quem participa quanto de quem é chamado para dar plenárias e seminários. Isso reforça o sentimento de que não somos bem-vindas nesses espaços.

Marcele Passos - Há uma cultura machista enraizada, o que torna a nossa "fala" ocultada. Fomentar a participação feminina é uma questão de equidade. As mulheres têm o direito de acessar todas as áreas do conhecimento e contribuir com elas. Um dos grandes desafios de ser mulher cientista na área de Ciências Exatas é a desigualdade de gênero, a menor visibilidade e a dificuldade de acesso às oportunidades em comparação aos homens.

Mudanças para inclusão e diversidade na ciência

Carolina Benone - As meninas costumam ser menos incentivadas a se interessar por temas de ciência desde muito cedo. Então, acredito que iniciativas que busquem, ainda na infância, promover esse interesse são primordiais. Também é importante que elas tenham modelos em quem possam se inspirar, para que vejam que elas também podem estar ali. Portanto iniciativas que promovam a valorização e o reconhecimento das contribuições de mulheres para a ciência podem ter um impacto muito grande.

Marcele Passos - É muito importante promover modelos femininos de sucesso, principalmente nas Ciências Exatas e Engenharias, quebrando os estereótipos de gênero desde cedo. Além disso, é fundamental apoiar a inclusão e a permanência de mulheres e mães na carreira científica. Programas educacionais que despertam o interesse por Matemática, Física e Engenharia, junto com iniciativas de mentoria e suporte, podem fazer toda a diferença. Criar ambientes acadêmicos mais inclusivos e livres de preconceitos também é essencial para que as meninas se sintam acolhidas e motivadas a seguir essas áreas.

Impacto do Para Mulheres na Ciência

Carolina Benone - O prêmio “Para Mulheres na Ciência” é uma iniciativa importante porque é um reconhecimento e uma valorização de mulheres que atuam nessa área e porque promove modelos para outras mulheres e meninas que tenham interesse em ciência. Este prêmio também traz muita visibilidade, o que gera oportunidade de estabelecimento de novas colaborações, além de uma responsabilidade de corresponder às expectativas.

Marcele Passos - Programas como o "Para Mulheres na Ciência" ajudam a inspirar outras mulheres a seguirem a carreira científica, além de destacar a diversidade como pilar para o avanço do conhecimento. Essa visibilidade também combate a invisibilidade histórica enfrentada por mulheres na área científica, incentivando mais jovens a ingressarem nesse caminho.

Pesquisas premiadas

Carolina Benone - Nos últimos anos, tivemos dois marcos muito importantes na história da relatividade geral: detecção de ondas gravitacionais e imagem da sombra de buracos negros. Estamos agora em um momento em que podemos testar os limites da relatividade geral e os possíveis desvios dela. Podemos, então, estudar diferentes objetos compactos e buscar formas de diferenciá-los usando detecções presentes e futuras.

Marcele Passos - O próximo passo é dar continuidade no desenvolvimento de curativos tridimensionais, que imitam tecidos biológicos e permitem a liberação controlada de medicamentos. Meu foco é ampliar o acesso a tratamentos mais eficazes e menos dolorosos para pacientes de regiões remotas, especialmente os atendidos pelo SUS. Quero avançar na pesquisa para tornar essas soluções acessíveis no tratamento de doenças negligenciadas, como a leishmaniose cutânea, e promover a sustentabilidade ao explorar os recursos da biodiversidade amazônica de forma responsável, valorizando o conhecimento das comunidades locais.

Conselhos para jovens pesquisadoras

Carolina Benone - Que elas busquem outras meninas e mulheres que tenham interesse nessa área também para buscar esse apoio mútuo. O sentimento de que não pertencemos a esses espaços pode ter um grande impacto nas nossas escolhas. Portanto ter pessoas à sua volta que possuam experiências semelhantes e que tenham o mesmo objetivo pode trazer alento e força. Quando caminhamos juntas, vamos mais longe.

Marcele Passos - Sejam ousadas em seus sonhos e persistentes em suas conquistas. Pois cada tentativa irá aproximá-las do sucesso. As ideias transformadoras só vêm de quem tem dedicação e ousa investigar. Não tenham medo de ousar, de seguir um caminho diferente e de ir além do que é esperado. O sucesso raramente surge sem esforço e sem coragem para tentar, errar e recomeçar.

Edição: Edmê Gomes Paixão
Beira do Rio Ed.173 - Dez/Jan/Fev 2024-2025