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Outros caminhos e novos lugares

Escrito por Beira do Rio | Publicado: Segunda, 13 de Abril de 2020, 20h16 | Última atualização em Segunda, 27 de Abril de 2020, 21h38 | Acessos: 3630

Educação ressignifica papéis de mulheres Ka'apor

Por Adrielly Araújo Foto Acervo da Pesquisa

Em 2018, a líder indígena Joênia Wapichana, primeira advogada indígena a exercer a profissão no Brasil, foi eleita para representar o estado de Roraima no Congresso Nacional como deputada federal. Isso exemplifica o começo de uma ressignificação dos papéis sociais das mulheres indígenas, que se apropriam de novos lugares dentro e fora da sua tribo.

A pesquisadora Leidiani Pena Pinheiro também percebeu essa mudança nas relações de poder na comunidade Xie Pihu Renda, onde dava aulas de português, “eu queria entender o que ocasionou a mudança naquela comunidade, onde nós tínhamos uma cacica e várias lideranças femininas muito fortes”, explica. Partindo dessa percepção, escreveu sua dissertação intitulada O papel social das mulheres ka’apor dentro da comunidade Xie Pihu Renda/Terra Indígena Alto Turiaçu, apresentada no Programa de Pós-Graduação em Educação, Cultura e Linguagem, do Campus Universitário de Tocantins/Cametá da UFPA, sob a orientação do professor Jorge Domingues Lopes.

Na pesquisa, Leidiani Pinheiro buscou entender como as mulheres conseguiram alcançar posições de poder, em uma comunidade em que os papéis são muito bem estabelecidos, e quais mudanças sociais ocorreram para que isso fosse possível. Para tanto, entrevistou dez pessoas, homens e mulheres indígenas, residentes na comunidade.

“Segundo o meu orientador, eu deveria olhar as mulheres não só pelo ponto de vista delas, mas também pelo ponto de vista dos homens, não como uma forma de validação masculina, e sim por entender que não havia uma subjugação ou inferioridade entre os gêneros. Os papéis sociais de homens e mulheres Ka’apor se completam e são fundamentais para a sobrevivência desse povo. Em minha opinião, essa perspectiva foi o que enriqueceu a minha pesquisa”, avalia Leidiani.
A análise foi feita por meio da convivência da pesquisadora com a comunidade. “Eu fiquei cinco anos frequentando o local como professora e, sempre que podia, observava as conversas das meninas. Frequentemente, eu estava entre as mulheres e, durante as conversas, eu perguntava: ‘mas por que isso? por que aquilo?’. Durante todo o tempo, eu estava pesquisando, gravando e anotando”, conta a professora.

A pesquisa rompeu com lugares-comuns na comunidade

De acordo com Leidiani Pinheiro, um dos principais motivos para a construção da pesquisa foi a “quebra” dos lugares-comuns na comunidade, o que justifica a necessidade do estudo. “O papel da mulher não incluía o de liderança, isso era algo novo para elas, que tinham o papel de cuidar da casa, dos filhos, da roça. Mas sentar entre os homens e discutir política, educação e saúde é algo recente. As mulheres passaram a ocupar esse lugar, a sentar ao lado deles e discutir no mesmo nível”, explica.

A pesquisadora alerta que não se deve pensar na mulher Ka'apor como um ser fragmentado, passível de ser estudado por partes, deve-se tentar enxergá-la como um todo que compõe o “ser mulher”, entendendo que, ao sair do ambiente escolar, ela ainda será mãe e esposa e terá que desenvolver atividades sociais e culturais na tribo.

Leidiani Pinheiro manteve seu foco na educação e em como ela abriu espaço tanto para as mulheres em suas comunidades quanto para os homens e as mulheres na sociedade não indígena. “Com base no que vivenciaram, os Ka’apor veem na educação a ‘fórmula’ para visibilidade das suas necessidades, reivindicações, lutas e, também, de sua cultura. Durante conversas e entrevistas, a importância do estudo era sempre mencionada, pois, assim, poderiam lutar por seus direitos, saberiam agir diante das dificuldades e participar das decisões que dizem respeito ao seu povo e às suas comunidades”, conta a pesquisadora.

A professora pôde constatar como a educação favoreceu a mudança do comportamento feminino na tribo. “Observei de perto essa transformação da mulher indígena. A escola contribuiu para que elas pudessem participar mais, ocupando espaços dentro e fora da comunidade. Elas estão trabalhando como auxiliar de saúde bucal, auxiliar de enfermagem, professora etc. Existe um novo acesso e as mulheres estão ocupando espaços que não existiam ou que só os homens podiam ocupar”, revela.

Leidiani Pinheiro alerta para o que chama de negligência governamental, “o que eu mais temo com relação a esses povos é a falta de cuidado por parte do governo, como já ocorre em relação à invasão das terras tradicionais”. A pesquisadora lembra que o governo é responsável por todas as pessoas em território nacional, indígena ou não indígena.

Perfil das mulheres entrevistadas

Idade: de 32 a 76 anos
Estado civil: casada ou viúva
Filhos: 1 a 8 filhos
Ocupação: pajé, estudante, cuida dos afazeres da comunidade, pesca, cuida dos afazeres dos domésticos, roça, artesã, servidora da escola, professora, líder das mulheres na comunidade, capitoa de três comunidades e cacique.

Ed.154 - Abril e Maio de 2020

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