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Resenha: Sobre quadrinhos e estereótipos

Publicado: Sexta, 16 de Fevereiro de 2018, 15h00 | Última atualização em Sexta, 16 de Fevereiro de 2018, 15h43 | Acessos: 3482

Sobre quadrinhos e estereótipos

Por Walter Pinto Reprodução Alexandre de Moraes

Em 2019, a história em quadrinhos brasileira completará 150 anos de vida, se o parâmetro for o surgimento da que é considerada a primeira história sequencial gráfica nacional, As aventuras de Nhô-Quim e Zé Caipora, criada pelo chargista Angelo Agostini, entre os anos 1869 e 1883. Da época em que os quadrinhos não tinham balão à arte finalizada nos programas computacionais atuais, as HQs se consolidaram como publicações de grande circulação e enorme interesse público. Foi, certamente, tendo em vista esse alcance que a Casa Brasil-África, da UFPA, escolheu o desenho em quadrinho como meio para mostrar o continente africano de uma forma que não imaginamos.

Africano pai d’égua é uma revista que traz de volta os estudantes Rayssa, Haroldo e Xavier, personagens publicados, em 2015, na revista Orientações Acadêmicas, editada pela Proeg. Criadas pelo roteirista Ricardo Ono e pelo quadrinista Volney Nazareno, as personagens agora se envolvem numa aventura por Cabo-Verde, Angola, República do Congo, Benin e Guiné-Bissau, países africanos que a maioria dos brasileiros conhece bem pouco, excetuando os que se dedicam ao estudo do continente. É este o objetivo de Africano pai d’égua: oferecer ao leitor informações corretas sobre a diversidade de culturas, tradições, histórias, etnias e recursos naturais daqueles países africanos, não por acaso, os que possuem expressivos números de alunos na UFPA.

A história é urdida pelo roteirista de uma forma que o personagem Haroldo tem a rara oportunidade de percorrer os cinco países, onde constata, por exemplo, que o que conhecemos sobre eles são não mais que ideias estereotipadas. Tais ideias se difundiram durante o Imperialismo Pós-Guerra, que retalhou o continente, desconsiderando o desenho étnico então existente, com as quais o cinema de Hollywood contribuiu com notável dose de exotismo. Uma dessas histórias se passa em Benin, onde Haroldo é levado para assistir a um festival de Voodoo, uma religião ancestral do candomblé brasileiro, em nada semelhante aos bonecos crivados de agulhas que nos vêm à memória.

Tudo começa no RU da UFPA, onde Haroldo é apresentado a Natanael, um estudante alto, negro, bolsista da Casa Brasil-África que acabou de defender seu TCC e está prestes a regressar ao seu país,  Guiné-Bissau. O grupo de amigos conhece também Mayara, uma cabo-verdiana, aluna da UFPA por meio do Programa de Estudante-Convênio de Graduação (PEC-G). O programa abrange 45 países da América, da África e da Ásia. Na UFPA, estudam jovens provenientes de 18 desses países.

De férias, o grupo de estudantes aceita o convite de Nataneal e Mayara para visitar seus países, começando por Cabo-Verde. Ficamos conhecendo alguns pontos característicos desse pequeno país insular da costa atlântica, com extensão equivalente a 1/10 da Ilha do Marajó, do Mercado de Sucupira, semelhante ao Ver-o-Peso, à música da grande cantora Cesária Évora. Um descuido de Haroldo vai levá-lo a um roteiro de viagem inteiramente diferente do roteiro programado. Em Angola, a antiga colônia portuguesa que conquistou independência em 1975, ele desfaz a velha imagem que tinha das cidades africanas, segundo a qual, não passavam de aldeias com cabanas rodeadas de animais selvagens. A Angola vista por Haroldo é um país grande e moderno.

Na República do Congo, ex-Zaire, ele aprende hábitos da cultura local, entre os quais, esperar sempre que os mais velhos lhe estendam a mão para o cumprimento. Saboreia o “mpondu”, um prato parecido com a nossa maniçoba, mas com peixe. Em cada lugar visitado, nosso protagonista faz novas amizades, reforçando o traço hospitaleiro dos africanos. Muitos desses novos amigos são jovens que estudam na UFPA e passam férias em casa.

Antes de chegar à Guiné-Bissau, onde os amigos o esperam, Haroldo passa por Benin, de onde foram arrancados africanos para o trabalho escravo no Brasil. Os descendentes de escravos que conseguiram voltar, curiosamente, se denominam brasileiros. O francês é a língua oficial, em decorrência da colonização imperialista, mas falam-se também diversos dialetos por conta dos cerca de 40 grupos étnicos lá existentes.

O fim da aventura ocorre num dos países considerados mais alegres do continente, a Guiné-Bissau. Um pouco menor que o Rio de Janeiro, nele habitam 1,5 milhão de africanos. Juntos, os amigos visitam a Fortaleza de São José da Amura, que Haroldo diz parecer com o Forte do Castelo. Ao final da visita, afirmam ter adorado conhecer a verdadeira África. “Foi uma oportunidade para desconstruir estereótipos e preconceitos e contribuir para a construção de novos saberes”.

Para criar a história, roteirista e desenhista lançaram-se à pesquisa em livros e em documentos, além de ouvirem relatos de universitários africanos. De posse das informações, os autores criaram situações fictícias pelas quais se movem personagens baseados em pessoas reais. “Africano pai d’égua” mostra a capilaridade internacional da UFPA, sua presença e importância continental. É indicada para todos os leitores, especialmente para alunos da disciplina História da África. Dificilmente, eles terão a seu dispor uma publicação tão criativa quanto esta.

ServiçoAfricano pai d’égua. Revista em quadrinhos. Roteiro e projeto gráfico Ricardo Ono/ Desenho Volney Nazareno. UFPA, 2017.

Ed.141 - Fevereiro e Março de 2018

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